Carmen Fontoura
Faltam poucos segundos... Estou chegando... A emoção toma conta de mim. Cheguei. Estou diante da casa, onde passei a minha adolescência. Muitas lembranças surgem, amontoadas, confusas. A idade talvez atrapalhe um pouco. Ou será a quantidade de lembranças?
Pouca coisa resta da casa onde vivi. O jardim murchou. As cores desbotaram. Os vizinhos não mais existem. A vida mudou. O sol brilha forte e esquenta. O clima mudou, mas, no meu conforto, uma espécie de bolha protetora, não sinto calor nem frio. Do meu conforto, sei que vejo cores que não mais existem. Respiro um ar especial, puro. Paguei caro pelo meu conforto.
Não me atrevo a sair do meu conforto. Vejo tudo daqui. Sei que a visão é tratada, mas vale a pena. Minha alma não é pequena. Quem escreveu? Não consigo mais lembrar... Como era?? Deixa pra lá!... Estou na frente da minha casa. Posso resgatar algum tempo. Posso sorrir um pouco mais. Se eu apertar a campainha, será que a música volta. Ah! Que delícia! Que som! É tratado, mas é muito bom.
Houve uma época em que chamavam terceira idade a minha faixa etária. Agora é idade confortável. Os velhos começaram a aumentar, aumentar... e tudo mudou. Passaram a ser ouvidos. Existem os direitos e os deveres. Ser experiente dá status e poder. Só a idade confortável conheceu o mundo diferente. Nem melhor, nem pior...
Está na hora de voltar. Meu conforto avisa. Foi gratificante voltar, rever, ouvir, lembrar, sentir. Infelizmente, não posso mais ficar. Tenho que voltar. Preciso trabalhar. As crianças esperam por mim. Aos noventa e uns, tenho um mundo a construir.
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