terça-feira, 22 de abril de 2008

Uma solução para o Caso Isabella

Fernando Goldman

Gente!
Tem alguma coisa errada comigo! Alguma coisa muito errada. Ou talvez com a sociedade em que eu vivo.
Eu pergunto: Pode haver algo pior do que um pai ver sua atual esposa matar sua filha, fruto de outra relação, e aí aproveitar a oportunidade para jogá-la pela janela?
Pode! Acho que pior do que isso, só o imaginar, com naturalidade, que isso possa acontecer.
É aí que eu vejo que há algo errado comigo. Como diria Fernando Pessoa: “Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo”. Pois diante dos fatos. Diante de todas as evidências. Diante das provas produzidas pela polícia. Opa! “Produzidas” pode dar uma idéia de fabricadas. Melhor dizer todas as provas colhidas.
Pois bem, diante de tudo isso e das revelações de detalhes da vida do pai, como por exemplo, de que ele fez a prova da OAB três vezes e não passou, como se isso fosse algo incriminador, eu simplesmente me recuso a querer imaginar que um casal, por acreditar que uma criança morreu vítima de um solavanco mais forte, discutiu sobre o que fazer com ela e ambos chegaram à brilhante decisão de simular um assassinato, cometido por um invasor. Um terceiro, que teria jogado Isabella pela janela.
Isso tudo na frente de dois outros filhos. Pequenos é verdade, mas conhecedoras dessa possível verdade.
Pois é. Vendo a entrevista de Alexandre Nardoni e Anna Carolina, domingo, na televisão, eles não me passaram muita credibilidade. E foi aí que eu passei a acreditar neles. Você já viu um golpista que não quer parecer convincente? É! Da total falta de uma postura que mostrasse inocência, comecei a acreditar na possibilidade de aqueles dois estarem em total confusão mental. E comecei a me fazer umas perguntas malucas, fruto talvez da minha relutância em acreditar que a alma humana possa produzir um pai, que por mais dificuldade de se expressar que tenha, seja capaz de jogar sua filha pela janela do quarto de seus dois outros filhos.
Eu não sou policial, não sou psicólogo e pensando bem nem sei o que eu deveria ser para não me fazer uma pergunta tão boba. Por que jogar a filha, teoricamente morta, do quarto dos dois outros filhos, se ela tem seu próprio quarto? Parece uma pergunta doida, não é? Pois está aí uma coisa, que se foram eles mesmo que mataram a menina, eu vou ter muita curiosidade de entender.
Aliás, bem peculiar a situação desse tal de Alexandre Nardoni, que tem dois filhos com a atual esposa, compra um apartamento de três quartos e monta um quarto só para a filha de outra relação, que nem mora com ele.
Vejo também uma reportagem que dá como certa a autoria do crime pelos pais e afirma que Alexandre Nardoni sempre teve uma vida confortável. Diz mais, que quando era estudante de faculdade, tinha um Vectra último modelo, comprado pelo pai, e uma moto esportiva Honda CBR 900 RR (hoje avaliada em 60 000 reais). Era dono de uma concessionária de motos e fazia estágio no escritório do pai, o advogado tributarista Antonio Nardoni.
Ora, eu já tinha visto muita gente justificar a infância pobre para entrar no mundo do crime. Já tinha visto muito filhinho de papai se desviar de seu caminho, mas ainda não tinha pensado na hipótese de um filho de um advogado bem sucedido, formado em direito também, resolver jogar a filha, teoricamente morta, pela janela, para escapar da cadeia. Fico pensando que se isso caracterizar um nexo causal, quantos filhos de pais bem sucedidos que ainda não encontraram o mesmo grau de sucesso são assassinos em potencial, soltos por aí.
Depois, leio na mesma reportagem que a investigação que culminou no indiciamento do casal foi realizada por investigadores do 9º Distrito Policial de São Paulo. Diz a reportagem que a investigação não ficou a cargo da Delegacia de Homicídios, porque se achou por bem manter no caso os policiais que a iniciaram, ou seja , e aí vai minha interpretação, os que no primeiro momento descartaram qualquer outra hipótese e apostaram na culpa do casal. A reportagem cita o delegado Aldo Galiano, diretor do Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo que teria afirmado que com isso, ganhou-se em precisão. "Fizemos um trabalho sem pressa e sem pressão, privilegiando o aspecto técnico do caso".
Eu tenho mesmo dificuldade de entender as coisas policiais. Pensava que o pessoal de uma delegacia especializada em homicídios seria o verdadeiro “aspecto técnico” de um caso de homicídio. E eu me pergunto também: os investigadores do 9º Distrito Policial de São Paulo não são de certa forma parte interessado no resultado final desse caso?
Pois muito bem. Já disse que não sou policial, não entendo nada disso, mas vou formular uma hipótese, pois do pouco que aprendi nas ciências, é formulando hipóteses que se chega a uma teoria válida.
Os pais afirmam que não mataram. Não houve arrombamento. Não há evidências de uma terceira pessoa na cena do crime, pois então como escritor eu tenho o direito de imaginar uma história. Mesmo que amanhã o casal confesse o crime, sempre vale à pena contar uma história.
Quantos empregados tem o prédio do ocorrido? Não sei. Sei que havia um porteiro na guarita ou na portaria. Será ele o único funcionário do prédio? Ele mora no prédio ? Tem parentes que moram no prédio ? Bem , deixemos de divagações e vamos à história:
Alguém, de dentro do prédio, tinha a chave do apartamento. Como? Não sei. Mas isso é bem possível de acontecer.
Esse alguém, sabendo que a família estava fora e sabendo que o prédio, ainda semi-vazio, tem pouco movimento, usa sua chave para entrar e verificar se há algum objeto que possa render algum trocado. Talvez para comprar drogas (estou inventando a história agora, talvez haja outras possibilidades). De repente, o Alexandre Nardoni chega com a menina adormecida no colo.
A terceira pessoa (vamos chamá-la assim, pois não sabemos se é homem ou mulher) se esconde em algum canto da casa. Está em pânico, ofegante, prestes a ser descoberta a qualquer momento e ter de explicar o que está fazendo ali ou ter de lutar para fugir e talvez até ter de usar a violência para escapar de ir, ou quem sabe voltar, para uma prisão suja.
Alexandre sabe que a menina está extenuada por um dia de passeios e brincadeiras com os irmãos. Deixa-a rapidamente na cama e, seguro de que ela dormia profundamente, apaga a luz do corredor, passa a chave na porta e vai buscar o resto da família.
A terceira pessoa percebe a oportunidade de escapar da enrascada em que se meteu, avança pelo corredor e acende a luz para enfiar a chave na porta mais rapidamente.
Porém, Isabella, ao ser carregada pelo pai e colocada na cama, saira do estado de sono profundo em que se encontrava, começando a despertar, vê a luz do corredor se acender. Meio sonolenta, levanta e vai receber os pais com os irmãzinhos.
Ao chegar ao corredor se depara com uma pessoa que conhece, mas que não tinha nada que estar fazendo em sua casa, àquela hora.
A terceira pessoa, ao ver Isabella, percebe escapar-lhe a última oportunidade de não ir para a prisão e resolve que não vai perder essa chance por causa de uma “simples garotinha”. Agarra a menina, que começa a gritar pelo pai, golpeia-a e tenta esganá-la. Não está segura de ter tido sucesso. Então lhe ocorre a idéia de fazer parecer que a menina se jogou pela janela. Arrasta-a para o primeiro quarto que encontra, já que por não ser da casa, não sabe que aquele quarto nada tem a ver com ela.
Para, simplesmente, jogar a menina, bastaria pegar uma faca ou uma tesoura e rasgar a rede de proteção em linha reta, mas a idéia era fazer parecer que a menina havia rasgado a rede para se atirar. Talvez simulando uma brincadeira de criança.
Por isso, a rede é cortada em círculo, dando a parecer tratar-se de uma traquinagem de criança que acabou mal.
Tendo jogado Isabella, a terceira pessoa sai o mais rapidamente possível pela porta com a chave que tem, tranca-a, porém esquece-se de apagar a luz do corredor e o resto da história todo mundo já conhece na versão de Alexandre.
Não é o tipo de história que eu gosto de contar.
Se amanhã os pais confessarem, ficou apenas como mais uma história, de um ingênuo que se recusar a acreditar nas evidências. Se isso não acontecer, tomara que o verdadeiro “aspecto técnico” resolva verificar essa hipótese.
Eu assistia, quando era criança, uma série na televisão chamada O Fugitivo, refilmado há pouco tempo, em que um médico jurava que sua esposa fora assassinada por um homem de um braço só, que apenas ele sabia existir. Não gostaria de ver esse filme em versão nacional.

5 comentários:

Ana Lúcia Prôa disse...

Fernando, qd penso no caso Isabella, sempre me vem isso à cabeça: quantos filmes já vi nos quais os supostos culpados são inocentes, fazem de tudo pra provar a inocência e só no finzinho do filme é que conseguem... Gostaria muito que este fosse o desfecho desta história real... Como mãe, é muito difícil digerir o acontecido. E como espectadora de um filme da vida real, fico aguardando uma virada fenomenal que leve ao verdadeiro culpado. Enquanto isso, porém, meu estômago continua embrulhado.

Parabéns pela crônica. Eu não teria tido fôlego para escrever sobre o assunto.

Beijos,

Ana

Fabio Bastos disse...

Fernando
Analisando sua crônica friamente, vc criou uma solução plausível para o caso, essa do fugitivo tupiniquim.
Um fato estranho nessa história bizarra tem sido o comportamento da mãe da menina. Ela parece não ter se importado muito com a morte da filha, como se tivesse se livrado de um fardo. Está mesmo deslumbrada com a notoriedade que o caso lhe deu. Não será surpresa se posar pelada para alguma revista.
Um final ainda mais macabro seria se fosse ela a tal pessoa e tivesse cometido o crime para incriminar o ex e a madastra.
Sem dúvida uma famíla muito estranha.
Sds
Fabio

Fernando Goldman disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fernando Goldman disse...

http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM821703-7823-POLICIA+UTILIZA+PERICIA+INCORRETAMENTE+NO+CASO+ISABELLA,00.html

Polícia utiliza perícia incorretamente no caso Isabella
Parte do trabalho da perícia foi interpretado incorretamente pela polícia, que investiga a morte de Isabella Nardoni. Segundo especialistas, não é possível afirmar que havia sangue da menina no carro.

Forte abraço

Fernando Goldman

Maria Teresa disse...

Ah... Fernando,
eu também gostaria de saber da existência de uma terceira pessoa porém, comprovadamente, não houve tempo hábil.
Como sempre sua crônica está impecável.
Esperamos você na "Oficina Informal".
Abraço,
Mª Teresa