Sergio Medina Quintella
[Tocam a campainha lá de casa, e eu abro a porta]
[Penso] “Ué, quem é esse cara com cara de alemão e muito parecido com Beethoven”
-Bom dia, o que deseja ?
- Não se assuste, meu nome é Ludwig Van Beethoven. Acabo de ressurgir neste mundo e, primeiramente, estou admirado de poder me comunicar no seu idioma, e o senhor é a primeira pessoa com quem estou mantendo contato desde que acabei de sofrer o fenômeno da ressurreição;
[Penso] “ Cara,era só essa que me faltava. Esse negócio de ressurreição e ainda por cima com Beethoven...
-Por favor entre, disse-lhe. Em que posso lhe ser útil, apontando para minha varanda.
- Depois desses séculos todos, minha enorme curiosidade acabou por despertar em mim uma vontade de tal ordem que o fenômeno da ressurreição se fez muito naturalmente,mas eu mesmo estou ainda sob forte impacto;
-Quer um café?, falei, tentando ser gentil, mas por dentro,ainda muito desconfiado com esse negócio de ressurreição...., Beethoven....;
-Olhe, senhor, procure se acalmar, eu não represento nenhum perigo, disse o “Beethoven”;
-Tá bom, senhor, aceite este café. Meu nome é Sergio. Não precisa me chamar de senhor;
- Sergio, sei que os tempos mudaram de uma forma extraordinária. Hoje a tecnologia praticamente domina o homem. No meu tempo não era assim. Por isso estou ávido de informações e de conhecimento do mundo atual. Pode falar normalmente porque com a ressurreição, minha surdez passou;
-Senhor, não sei se seria capaz de colocá-lo a par do mundo atual como talvez merecesse em vista da sua respeitável contribuição para a cultura musical da humanidade,mas também não gostaria de deixá-lo sem nada conhecer e sair daqui de casa praticamente como chegou. Estou à sua disposição;
- Sergio, minha carreira e obra musicais foram feitas em cima do cravo e do piano. Escrevi muitas partituras compondo obras para orquestras completas, de câmera, duetos, quartetos para violino, chello enfim,muita coisa, como talvez você tenha ouvido falar. Como está o ambiente musical atualmente?
- [A essa altura,já me considerava mais íntimo].
- Beethoven, disse-lhe , desde uns tempos para cá, mais ou menos 30 a 40 anos, estamos vivendo a era da música eletrônica;
- Eletrônica? Que negócio é esse ? Que é isso?
-Um tal de Benjamim Franklin descobriu a eletricidade e a partir daí alguns cientistas e pesquisadores começaram a inventar aplicações para ela. A música eletrônica tem os sons dos instrumentos produzidos pela eletricidade. Hoje há um aparelho chamado “teclado” que imita com perfeição praticamente todos os tipos de instrumentos musicais, e ainda por cima dá o acompanhamento e o ritmo que se deseja;
-Fantástico !!, onde posso dar uma olhada nesse tal de teclado?
-Ele pode ser visto e experimentado em qualquer loja de instrumentos musicais.É só entrar e se dirigir ao vendedor, mas eu não aconselho de imediato fazer isso não porque vai dar uma tremenda confusão, ou melhor, convulsão.
-Vamos pensar um pouco mais como fazer isso e por enquanto falarei mais alguma coisa.
-Não se assuste muito com o que vou falar,mas nos tempos em que vivemos, você pode ir tocando no teclado de um computador e ele grava a composição num arquivo e depois você pode imprimir a partitura .Ela já sai impressa direto de um aparelho chamado impressora.
-Esse negócio de computador dói muito? É dor forte? É assim que se compõe?
-Nada disso seu “Beethoven”, computador não quer dizer que a dor é fortíssima e sim que se trata de um equipamento eletro-eletrônico.
-Eletro o que? Quero conhecer esse tal de Benjamim Franklin, o que você diz que inventou a eletricidade.
-Ele já morreu há séculos. O melhor que posso fazer agora é lhe mostrar um computador. Entre aqui no meu escritório. Lá está naquele canto. Junto com ele está aquela janela de vidro que chamamos monitor e aquele outro aparelho meio quadradinho,que chamamos impressora. Com isso, Beethoven, você tem uma orquestra inteira.
-Sergio, posso tentar recompor a 9ª Sinfonia? . Na época em que a compus, já estava totalmente surdo.
-Seu “Beethoven”, o senhor não me leve a mal,mas poderia voltar para onde estava e retornar daqui uns tantos meses?
-Ué, por que?
- Preciso da ajuda de um profissional chamado psicólogo, apoiado por um outro que denominamos psiquiatra. Acho que só eles podem fazer-me entender o que está se passando. Depois,eu prometo que vou levá-lo para ver um teclado e mais tarde ensiná-lo a mexer nesse computador. Agora, não dá não. Dá licença e passe bem...digo-lhe,abrindo a porta de casa..
domingo, 22 de junho de 2008
terça-feira, 17 de junho de 2008
Exagerado
Therezinha Mello
Joaquim era, por natureza, exagerado. Até mesmo nas proporções de sua compleição física, possuindo alta estatura e abdômen avantajado. Perto dele acabávamos às gargalhadas, porque sua alegria precisava de espaço. Abraçava-nos com muita firmeza e sinceridade, dando-nos a impressão de que jamais abraçaria ninguém, se não fosse daquela forma. A voz rouca acompanhava o sorriso quase infantil, de dentes miúdos. Sim, porque o rosto era uma exceção. Joaquim tinha na fisionomia de criança uma expressão gentil e, o olhar, era doce.
Nos bares, em pleno verão, chegava calorento e juntava-se a nós. Chamava de imediato o garçom e pedia logo dois chopes. Alguém dizia: “-Não, pra mim não precisa!”. Ele ria, divertido. Quando o garçom se aproximava com a bebida na bandeja, segurava-lhe o braço com a mão esquerda e, com a direita, entornava o primeiro chope na garganta de uma só vez. Devolvia à bandeja o copo vazio, dizendo ao garçom: “-Obrigado. Pode levar.”. Só então o libertava, soltando-lhe o braço. Depois continuava conversando e, bebendo em ritmo normal, o segundo chope estrategicamente solicitado. Viriam, na seqüência, outros tantos, enquanto houvesse história pra contar, gente pra ouvir e petiscos para acompanhar.
Uma vez o médico recomendou que ele só comesse queijo, se fosse branco. Nenhum outro era permitido. “-Sabe como é, Sr. Joaquim! É mais saudável, o senhor vai ver! Precisamos baixar este colesterol.”. Joaquim deixou o consultório pensativo. Logo ele que fritava pele de galinha pra comer com cerveja! Só de pensar dava água na boca... Mas, ordens são ordens. E, médicas então, nem se fala. Passou pelo supermercado e comprou logo meia dúzia de queijos. “-Estavam fresquinhos!”, contou-nos depois, justificando-se. Chegou em casa, cortou um deles em pedaços miúdos e comeu, todo, com bastante sal e um fiozinho de azeite por cima . Não satisfeito, fez-se acompanhar por uma cerveja bem gelada. Os outros cinco ele acabou com todos durante a semana seguinte. Com a consciência tranqüila fez, do seu jeito, o que o médico havia determinado com cautela e bom senso.
Certa vez foi ao Marrocos com a mulher e alguns amigos. Logo que chegou, percebeu que um marroquino esperto cobrava uma fortuna em dólares para quem quisesse dar uma voltinha de camelo. Ele não quis, dizendo que não era maluco, nem idiota. Deixou o marroquino falando sozinho e continuou o passeio. Sua mulher, ao contrário, encantou-se pela idéia e, quando ele se deu conta, ela já estava lhe acenando do alto do ruminante. Primeiro ele achou um absurdo e ficou irado. Depois, como sempre, inventou uma piada. Chegou ao Brasil contando pra todo mundo que sua mulher, pelo preço que pagou, tinha comprado um camelo no Marrocos e estava até agora esperando a entrega a domicílio. Ela o fuzilava com os olhos e, nós, nos acabávamos de rir.
Minha tarde ontem ficou nublada. Triste mesmo. Fiquei sabendo que o Joaquim morreu, já há alguns anos. Hoje em dia está se tornando comum a gente se perder das pessoas que gosta, tropeçando nos compromissos e envolvendo-se na pressa. De repente, leva um soco na boca do estômago. Por muito tempo, ignorando a sua morte, lembrei dele como se estivesse vivo. E acho, francamente, que tudo pode continuar assim. Joaquim sempre gostou de viajar, de correr mundo. E quem me garante que não é isso mesmo o que ele está fazendo? Correndo mundo? E se eu bem conheço o meu amigo, está feliz. Está muito, muito feliz se querem saber, porque o Joaquim não é de deixar por menos. Sempre foi exagerado. Muito exagerado.
Joaquim era, por natureza, exagerado. Até mesmo nas proporções de sua compleição física, possuindo alta estatura e abdômen avantajado. Perto dele acabávamos às gargalhadas, porque sua alegria precisava de espaço. Abraçava-nos com muita firmeza e sinceridade, dando-nos a impressão de que jamais abraçaria ninguém, se não fosse daquela forma. A voz rouca acompanhava o sorriso quase infantil, de dentes miúdos. Sim, porque o rosto era uma exceção. Joaquim tinha na fisionomia de criança uma expressão gentil e, o olhar, era doce.
Nos bares, em pleno verão, chegava calorento e juntava-se a nós. Chamava de imediato o garçom e pedia logo dois chopes. Alguém dizia: “-Não, pra mim não precisa!”. Ele ria, divertido. Quando o garçom se aproximava com a bebida na bandeja, segurava-lhe o braço com a mão esquerda e, com a direita, entornava o primeiro chope na garganta de uma só vez. Devolvia à bandeja o copo vazio, dizendo ao garçom: “-Obrigado. Pode levar.”. Só então o libertava, soltando-lhe o braço. Depois continuava conversando e, bebendo em ritmo normal, o segundo chope estrategicamente solicitado. Viriam, na seqüência, outros tantos, enquanto houvesse história pra contar, gente pra ouvir e petiscos para acompanhar.
Uma vez o médico recomendou que ele só comesse queijo, se fosse branco. Nenhum outro era permitido. “-Sabe como é, Sr. Joaquim! É mais saudável, o senhor vai ver! Precisamos baixar este colesterol.”. Joaquim deixou o consultório pensativo. Logo ele que fritava pele de galinha pra comer com cerveja! Só de pensar dava água na boca... Mas, ordens são ordens. E, médicas então, nem se fala. Passou pelo supermercado e comprou logo meia dúzia de queijos. “-Estavam fresquinhos!”, contou-nos depois, justificando-se. Chegou em casa, cortou um deles em pedaços miúdos e comeu, todo, com bastante sal e um fiozinho de azeite por cima . Não satisfeito, fez-se acompanhar por uma cerveja bem gelada. Os outros cinco ele acabou com todos durante a semana seguinte. Com a consciência tranqüila fez, do seu jeito, o que o médico havia determinado com cautela e bom senso.
Certa vez foi ao Marrocos com a mulher e alguns amigos. Logo que chegou, percebeu que um marroquino esperto cobrava uma fortuna em dólares para quem quisesse dar uma voltinha de camelo. Ele não quis, dizendo que não era maluco, nem idiota. Deixou o marroquino falando sozinho e continuou o passeio. Sua mulher, ao contrário, encantou-se pela idéia e, quando ele se deu conta, ela já estava lhe acenando do alto do ruminante. Primeiro ele achou um absurdo e ficou irado. Depois, como sempre, inventou uma piada. Chegou ao Brasil contando pra todo mundo que sua mulher, pelo preço que pagou, tinha comprado um camelo no Marrocos e estava até agora esperando a entrega a domicílio. Ela o fuzilava com os olhos e, nós, nos acabávamos de rir.
Minha tarde ontem ficou nublada. Triste mesmo. Fiquei sabendo que o Joaquim morreu, já há alguns anos. Hoje em dia está se tornando comum a gente se perder das pessoas que gosta, tropeçando nos compromissos e envolvendo-se na pressa. De repente, leva um soco na boca do estômago. Por muito tempo, ignorando a sua morte, lembrei dele como se estivesse vivo. E acho, francamente, que tudo pode continuar assim. Joaquim sempre gostou de viajar, de correr mundo. E quem me garante que não é isso mesmo o que ele está fazendo? Correndo mundo? E se eu bem conheço o meu amigo, está feliz. Está muito, muito feliz se querem saber, porque o Joaquim não é de deixar por menos. Sempre foi exagerado. Muito exagerado.
segunda-feira, 16 de junho de 2008
Quem não gosta de festa?
Sergio Medina Quintella
Quem não gosta de festa?
Que eu saiba, muito pouca gente.
Na verdade, a festa começa mesmo na ocasião em que a gente toma conhecimento dela, e aí começa a imaginação a trabalhar.
Lembro–me das muitas festas que fui quando garoto e depois na minha adolescência.
Quando garoto,lá pelos meus 10 ou 12 anos, o negócio era ir às festas de aniversário.
Sempre fui muito arteiro e inventador.
Uma ocasião num aniversário daqueles, cheguei para meu primo, 3 anos mais novo, e falei:
- Vamos lá no banheiro nos fantasiar?
-Vamos, disse-me de imediato.
Entramos e começamos a nos enrolar no papel higiênico. Gastamos o rolo todo,e saímos pela Sala do apartamento pulando e acenando.!
Só que não era carnaval. Era um aniversário feito com todo carinho pela mãe do garoto aniversariante. O resultado já se viu né? Fomos imediatamente para o para o castigo e para nós a festa acabou ali, pois ao que parece, nossas mães não tinham muita intimidade com a anfitriã.
Na adolescência, continuávamos morando em Copacabana e havia uma patota maravilhosa !. Era um grupo de garotos e garotas ali do “ Posto 6 ” que convivia direto. Acho que uns 10 a 12.
Todos os Sábados a festa era na casa de um de outro, e falando sinceramente, lembro-me mais das casas das garotas. As melhores aconteciam quando elas moravam na Av. Atlântica, pois a gente ficava na janela apreciando o mar e o calçadão.
O negócio era gostoso. Tinha mãozinha dada, tinha beijinho, tudo sob a supervisão dos pais das garotas, é claro, que ficavam sentados nas cadeiras em volta da sala. Mas só podia fazer isso se estivesse namorando. Caso contrário, e verdade, nem se pensava,só imaginava...
Mais tarde um pouco, os já rapazes, praticavam muito esporte na praia. Eu por exemplo jogava futebol pelo “La vai Bola” , um time muito conhecido que sentava praça em frente da quadra entre as Ruas Francisco Sá e Souza Lima.
Os jogos começavam às 4 da tarde , terminando lá pelas 6 horas.
Ia-se para casa tomar um banho, descansar um pouco, jantar ( pois naquela época era inadmissível não jantar), e depois voltava-se para o calçadão para passear e fazer um pequeno “footing”. Lá pelas 9:30 hs o pessoal começava a aparecer na casa combinada.
Ah!, quase ia me esquecendo: A dona da casa era quem preparava os doces e salgadinhos juntamente com Coca ,.Pepsi, Guaraná, Grapete, Fanta Uva ou Fanta Laranja.
Tempo bom. Muita saudade mas, ....sem volta.
Finalmente, quando mais adultos, as festas á tinham perdido aquela atmosfera de certo romantismo, fantasia ou coisa parecida.
Muitos de nós já estávamos envolvidos com interesses mais sérios, e aí já rolava namoro sério, bailes de formatura dos cursos Clássico ou Científico.
Alguns mudaram-se de Copacabana, e assim, a época foi passando a adquirir feições diferentes até que a vida impulsionou boa parte daquela patota para outros rumos e paragens.
Quem não gosta de festa?
Que eu saiba, muito pouca gente.
Na verdade, a festa começa mesmo na ocasião em que a gente toma conhecimento dela, e aí começa a imaginação a trabalhar.
Lembro–me das muitas festas que fui quando garoto e depois na minha adolescência.
Quando garoto,lá pelos meus 10 ou 12 anos, o negócio era ir às festas de aniversário.
Sempre fui muito arteiro e inventador.
Uma ocasião num aniversário daqueles, cheguei para meu primo, 3 anos mais novo, e falei:
- Vamos lá no banheiro nos fantasiar?
-Vamos, disse-me de imediato.
Entramos e começamos a nos enrolar no papel higiênico. Gastamos o rolo todo,e saímos pela Sala do apartamento pulando e acenando.!
Só que não era carnaval. Era um aniversário feito com todo carinho pela mãe do garoto aniversariante. O resultado já se viu né? Fomos imediatamente para o para o castigo e para nós a festa acabou ali, pois ao que parece, nossas mães não tinham muita intimidade com a anfitriã.
Na adolescência, continuávamos morando em Copacabana e havia uma patota maravilhosa !. Era um grupo de garotos e garotas ali do “ Posto 6 ” que convivia direto. Acho que uns 10 a 12.
Todos os Sábados a festa era na casa de um de outro, e falando sinceramente, lembro-me mais das casas das garotas. As melhores aconteciam quando elas moravam na Av. Atlântica, pois a gente ficava na janela apreciando o mar e o calçadão.
O negócio era gostoso. Tinha mãozinha dada, tinha beijinho, tudo sob a supervisão dos pais das garotas, é claro, que ficavam sentados nas cadeiras em volta da sala. Mas só podia fazer isso se estivesse namorando. Caso contrário, e verdade, nem se pensava,só imaginava...
Mais tarde um pouco, os já rapazes, praticavam muito esporte na praia. Eu por exemplo jogava futebol pelo “La vai Bola” , um time muito conhecido que sentava praça em frente da quadra entre as Ruas Francisco Sá e Souza Lima.
Os jogos começavam às 4 da tarde , terminando lá pelas 6 horas.
Ia-se para casa tomar um banho, descansar um pouco, jantar ( pois naquela época era inadmissível não jantar), e depois voltava-se para o calçadão para passear e fazer um pequeno “footing”. Lá pelas 9:30 hs o pessoal começava a aparecer na casa combinada.
Ah!, quase ia me esquecendo: A dona da casa era quem preparava os doces e salgadinhos juntamente com Coca ,.Pepsi, Guaraná, Grapete, Fanta Uva ou Fanta Laranja.
Tempo bom. Muita saudade mas, ....sem volta.
Finalmente, quando mais adultos, as festas á tinham perdido aquela atmosfera de certo romantismo, fantasia ou coisa parecida.
Muitos de nós já estávamos envolvidos com interesses mais sérios, e aí já rolava namoro sério, bailes de formatura dos cursos Clássico ou Científico.
Alguns mudaram-se de Copacabana, e assim, a época foi passando a adquirir feições diferentes até que a vida impulsionou boa parte daquela patota para outros rumos e paragens.
domingo, 8 de junho de 2008
Importado com o Exportado
Vou avisando logo que após esta crônica posso acabar sendo obrigado a entrar em exílio, assim retardando a publicação da próxima crônica. Pêsames. Sei que para alguns não será um grande incômodo, mas espero, como qualquer escritor, que este grupo não seja muito grande.
Esta semana tem sido repleta de conversas sobre o OMC e a proteção dos alimentos para que o mundo não sofra. Mas no meio de vários discursos eloqüentes, lembrei de uma frase cujo autor me escapa, que sempre surge na minha cabeça cínica quando se trata de economia global: Não existe comunidade global.
Vou explicar para não soar ingênuo. O que a frase questiona é a vontade de governos individuais de fazerem o melhor para o mundo inteiro. Será que governos são movimentados por vontades tão nobres no dia-a-dia das maquinas nacionais?
A verdade é que cada um joga por si mesmo. Esperando agradar os cidadãos de seu pais(alguns mais que outros). E uma reunião para decidir como o mundo vai lidar com a falta de alimentos, nada mais é que uma convenção onde o real interesse trata-se de “Como que eu vou proteger o meu”. Se não fosse, a reunião duraria duas horas onde primeiro se olharia quanto o mundo produz de cada coisa, depois quanto cada um consume. Uma vez feito, começariam as distribuições proporcionais a preços iguais para todos, sem subsídios ou taxas de importação malucas. Mas o que acaba acontecendo é que todos querem lucrar, e os interesses das empresas falam mais alto que as do consumidor. E no final acaba sendo o velho jogo capitalista: Winners and Losers.
Foi então que me surgiu uma pergunta que não consegui responder. Por que, então, precisamos da comunidade Internacional? Calma não estou dizendo que não deveríamos trocar e aceitar mercadorias estrangeiras como o Iphone (estou doido pra comprar). Mas o Brasil como quinto maior pais do mundo tem solo suficiente para produzir tudo que precisaríamos aqui dentro. E por acaso tem também um numero suficiente de desempregados, ou empregados em atividades ilícitas que se aproveitados de forma legal, seriam uma força de trabalho gigantesca. Quem sabe podíamos até montar nossas próprias industrias, incluindo as de telefones celulares brilhantes.
Mas e os salários? Quem vai trabalhar em agronegocio ou em alguma fabrica por um salário mínimo, quando pode ganhar um dinheirão no trafico do Rio? Bom, se o que sobra da arrecadação de impostos fosse usado para incentivar empresas que atuam no solo nacional invés das que funcionam fora do pais, como faz o BNDES que acaba de receber um aumento de 12,5 bilhões de nosso generoso Senado, resolveríamos a questão do salário mínimo em algumas semanas. Claro, não estou sugerindo que nossos impostos sejam usados para motivar a industria nacional e criar empregos. Isto seria um absurdo.(Aviso: Sarcasmo é a forma mais baixa de humor)
Não entendo como um pais como o nosso pode estar olhando pra fora quando o cenário interno esta tão mal. Afinal, quando eu pago impostos quero que estes sejam aplicados na manutenção dos espaços públicos, na proteção dos cidadãos, no prover de água e alimentos, e para financiar as instituições publicas, (Administração, Saúde, Justiça). Fora isto, sou obrigado a declarar que começarei a querer investir meu dinheiro no metro de Caracas (isso mesmo na Venezuela) como faz nosso sagrado BNDES, quando tudo aqui estiver funcionando. Aí, sim, podemos conversar.
quarta-feira, 4 de junho de 2008
Duas Caras
Therezinha Mello
Débora resolveu fazer aquela festinha na última hora. Estava completando quarenta anos e, um mês antes, tinha confessado a uma amiga que andava meio de baixo astral e não queria nem comemorar o aniversário. Nem um chopp. Nada. Mas logo depois tinha conhecido Cláudio e sua vida tinha agora um novo colorido. Cláudio era professor de Física na PUC. Um intelectual charmoso que já ia pelos cinqüenta, cabelos grisalhos e uma inteligência fora do comum.
Ela convidou Cláudio para a reunião, na sua casa, sábado à noite. Deu um jeito na sala com a ajuda de uma amiga, decorou com uns arranjos de flores, providenciou salgadinhos e colocou cervejas na geladeira. Encomendou uma torta de chocolate, porque descobriu que Cláudio era chocólatra, sendo esse um de seus poucos prazeres mundanos. Levava a vida alheio a quase tudo, desvendando fórmulas e descobrindo soluções para as questões acadêmicas que lhe povoavam a mente.
Entregava-se a discussões filosóficas e era constantemente convidado para ministrar palestras até mesmo no exterior. Vivia cercado pelos alunos, que solicitavam explicações e bibliografias. Atendia a todos com paciência, embora com o ar desligado de quem está voltado para questões superiores, acima da compreensão geral.
Se não estivesse contaminada pela violenta paixão, se ainda lhe restasse um mínimo de bom senso, muito provavelmente Débora perceberia o ar estranho daquele intelectual. Mas àquela altura do campeonato, depois de um jantarzinho a dois na sexta-feira, Débora achava que tinha procurado a vida inteira por alguém assim. Tinha mudado radicalmente de interesses, mostrando-se atualizada com os novos lançamentos literários e sugerindo, sob os cenhos franzidos dos amigos, recitais de música erudita na Sala Cecília Meirelles.
Quando Claudio chegou, os olhares curiosos se voltaram para ele. Tentando ser simpático, cumprimentou os amigos de Débora com o ar mais casual que conseguiu demonstrar. Percebeu que Cristiano e Jader estavam em ferrenha discussão sobre o resultado de Vasco e Flamengo que estava terminando no Maracanã. Ficou meio sem jeito porque, de futebol, dizer que não entendia nada era muito. Pediu uma bebida à Débora e foi até a janela.
Isabela, vizinha de Débora, perguntou se ela não podia ligar a TV para verem o último capítulo da novela. Débora, rapidamente, fez um sinal com o indicador direito sobre os lábios, e pediu que a amiga calasse a boca.
“ –Onde é que já se viu? O Cláudio detesta novela! Ele nem podia imaginar quem era o Juvenal Antena. Que papo é esse de Portelinha? Quer acabar comigo?”
Isabela não conversou.
“– Aí pessoal! Quem quer ver o último capítulo da novela lá em casa?”
E a mulherada se atropelou na direção da porta. Elas precisavam saber com quem o Juvenal ia acabar. Em menos de cinco minutos a sala de Débora ficou praticamente vazia.
“– O que aconteceu?”, perguntou ele com ar distraído.
“– Ah, eu também não entendi. Não vejo novela, você sabe, mas parece que tem uma que acaba hoje...”
Ele sorriu com estranho interesse e perguntou:
“ – É “Duas Caras”?
E Débora, assustada:
“- Por que você está perguntando?”
Ele tentou disfarçar:
“- Por nada não. Será que eu posso ir até lá só um pouquinho?
E, roendo a unha do polegar desabafou ansioso:
“-Eu só quero ver se o beijo gay sai ou não sai...”
Débora resolveu fazer aquela festinha na última hora. Estava completando quarenta anos e, um mês antes, tinha confessado a uma amiga que andava meio de baixo astral e não queria nem comemorar o aniversário. Nem um chopp. Nada. Mas logo depois tinha conhecido Cláudio e sua vida tinha agora um novo colorido. Cláudio era professor de Física na PUC. Um intelectual charmoso que já ia pelos cinqüenta, cabelos grisalhos e uma inteligência fora do comum.
Ela convidou Cláudio para a reunião, na sua casa, sábado à noite. Deu um jeito na sala com a ajuda de uma amiga, decorou com uns arranjos de flores, providenciou salgadinhos e colocou cervejas na geladeira. Encomendou uma torta de chocolate, porque descobriu que Cláudio era chocólatra, sendo esse um de seus poucos prazeres mundanos. Levava a vida alheio a quase tudo, desvendando fórmulas e descobrindo soluções para as questões acadêmicas que lhe povoavam a mente.
Entregava-se a discussões filosóficas e era constantemente convidado para ministrar palestras até mesmo no exterior. Vivia cercado pelos alunos, que solicitavam explicações e bibliografias. Atendia a todos com paciência, embora com o ar desligado de quem está voltado para questões superiores, acima da compreensão geral.
Se não estivesse contaminada pela violenta paixão, se ainda lhe restasse um mínimo de bom senso, muito provavelmente Débora perceberia o ar estranho daquele intelectual. Mas àquela altura do campeonato, depois de um jantarzinho a dois na sexta-feira, Débora achava que tinha procurado a vida inteira por alguém assim. Tinha mudado radicalmente de interesses, mostrando-se atualizada com os novos lançamentos literários e sugerindo, sob os cenhos franzidos dos amigos, recitais de música erudita na Sala Cecília Meirelles.
Quando Claudio chegou, os olhares curiosos se voltaram para ele. Tentando ser simpático, cumprimentou os amigos de Débora com o ar mais casual que conseguiu demonstrar. Percebeu que Cristiano e Jader estavam em ferrenha discussão sobre o resultado de Vasco e Flamengo que estava terminando no Maracanã. Ficou meio sem jeito porque, de futebol, dizer que não entendia nada era muito. Pediu uma bebida à Débora e foi até a janela.
Isabela, vizinha de Débora, perguntou se ela não podia ligar a TV para verem o último capítulo da novela. Débora, rapidamente, fez um sinal com o indicador direito sobre os lábios, e pediu que a amiga calasse a boca.
“ –Onde é que já se viu? O Cláudio detesta novela! Ele nem podia imaginar quem era o Juvenal Antena. Que papo é esse de Portelinha? Quer acabar comigo?”
Isabela não conversou.
“– Aí pessoal! Quem quer ver o último capítulo da novela lá em casa?”
E a mulherada se atropelou na direção da porta. Elas precisavam saber com quem o Juvenal ia acabar. Em menos de cinco minutos a sala de Débora ficou praticamente vazia.
“– O que aconteceu?”, perguntou ele com ar distraído.
“– Ah, eu também não entendi. Não vejo novela, você sabe, mas parece que tem uma que acaba hoje...”
Ele sorriu com estranho interesse e perguntou:
“ – É “Duas Caras”?
E Débora, assustada:
“- Por que você está perguntando?”
Ele tentou disfarçar:
“- Por nada não. Será que eu posso ir até lá só um pouquinho?
E, roendo a unha do polegar desabafou ansioso:
“-Eu só quero ver se o beijo gay sai ou não sai...”
domingo, 1 de junho de 2008
Um tapa na Cara...de quem?
Esta semana diante de um novo temporal de acusações de corrupção obviamente verídicas, fomos comparados ao Chicago de 1930. Concorde ou não, não deixa de ser uma comparação forte. Para quem não conhece a historia se trata do gangsterismo de Al Capone. Um criminal admirável, para quem admira essas coisas. (no rio, aparentemente, todos)
Capone atuou na época da lei seca em Chicago, produzindo e distribuindo bebidas alcoólicas. A maioria de Chicago tinha uma empatia ao gangster, por discordarem da lei, inclusive os policiais que se beneficiavam do arrego e das bebidas. Até ai da pra ver uma semelhança com nossa cidade maravilhosa. Mas a diferença esta na dinâmica do problema.
Capone não fazia parte do governo. E embora seus subornos a vários membros do estado serem de conhecimento publico, quando finalmente foi pego pelo jovem Elliot Ness, perdeu um apelo nos tribunais e cumpriu 11 anos de prisão. Ou seja, quando a policia pegou, o Judiciário funcionou, e o bandido se danou (vou virar poeta). Mas é assim que funciona quando alguém é preso, cabe ao Judiciário apoiar ou reverter a ordem. Claro isso no primeiro mundo.
Na nossa terra porem, temos um sistema digamos um tanto diferente, mesmo assim igualmente fascinante. Aqui, o Legislativo pode libertar um homem! Isso mesmo, o órgão que faz as leis, também, aparentemente, pode julgar como elas estão sendo aplicadas. Esqueça aquela besteira sobre balanço de poderes.
Para quem chegou até aqui sem saber do que se trata, estou falando da decisão risível da Alerj de libertar Álvaro Lins. Álvaro como todo mundo já sabe, incluindo meu padeiro que é analfabeto e cego, é mais culpado que um padre num convento as três da madrugada. Parece, inclusive, que os únicos que não sabem disto são os 40 deputados que votaram na Alerj a favor da libertação.
Mas onde estão os nossos Heróis? Onde está o nosso Elliot Ness para arrastar o Capone até a prisão? E mais importante, onde está o nosso judiciário para garantir que ele fique lá?
Sem fazer apologia, existia lógica em Capone. Por mais infrator que ele era, por mais danoso à sociedade que ele pudesse ser, ele não era eleito, não se sustentava com finanças publicas ou as explorava. Ele não era um protetor da sociedade, era cidadão. E nisso Lins, consegue ser pior, pois abusou da confiança do cidadão.
Lins tornou ladrão do cofre publico no minuto que aceitou dinheiro meu, seu, nosso (como diz um grande jornalista) e agiu como um corrupto. Por isso ele deveria ser preso, e esquecido numa cela. E os membros da Alerj que agiram com intenções pervertidas igualmente.
Em realidade o caso só fez provar novamente que não existe coerência em nosso sistema. E os eventos desenrolam de uma maneira que nos deixam perplexos. A comparação é forte sim, e Chicago era um cenário cheio de corrupção e violência nos anos 30. Mas foi nesse mesmo cenário que o sistema quebrou o ladrão. Aqui ao invés, parece que o Ladrão infiltrou o sistema. E por isso me pergunto, com quem é a maior sacanagem da comparação: Nós ou Chicago?
Capone atuou na época da lei seca em Chicago, produzindo e distribuindo bebidas alcoólicas. A maioria de Chicago tinha uma empatia ao gangster, por discordarem da lei, inclusive os policiais que se beneficiavam do arrego e das bebidas. Até ai da pra ver uma semelhança com nossa cidade maravilhosa. Mas a diferença esta na dinâmica do problema.
Capone não fazia parte do governo. E embora seus subornos a vários membros do estado serem de conhecimento publico, quando finalmente foi pego pelo jovem Elliot Ness, perdeu um apelo nos tribunais e cumpriu 11 anos de prisão. Ou seja, quando a policia pegou, o Judiciário funcionou, e o bandido se danou (vou virar poeta). Mas é assim que funciona quando alguém é preso, cabe ao Judiciário apoiar ou reverter a ordem. Claro isso no primeiro mundo.
Na nossa terra porem, temos um sistema digamos um tanto diferente, mesmo assim igualmente fascinante. Aqui, o Legislativo pode libertar um homem! Isso mesmo, o órgão que faz as leis, também, aparentemente, pode julgar como elas estão sendo aplicadas. Esqueça aquela besteira sobre balanço de poderes.
Para quem chegou até aqui sem saber do que se trata, estou falando da decisão risível da Alerj de libertar Álvaro Lins. Álvaro como todo mundo já sabe, incluindo meu padeiro que é analfabeto e cego, é mais culpado que um padre num convento as três da madrugada. Parece, inclusive, que os únicos que não sabem disto são os 40 deputados que votaram na Alerj a favor da libertação.
Mas onde estão os nossos Heróis? Onde está o nosso Elliot Ness para arrastar o Capone até a prisão? E mais importante, onde está o nosso judiciário para garantir que ele fique lá?
Sem fazer apologia, existia lógica em Capone. Por mais infrator que ele era, por mais danoso à sociedade que ele pudesse ser, ele não era eleito, não se sustentava com finanças publicas ou as explorava. Ele não era um protetor da sociedade, era cidadão. E nisso Lins, consegue ser pior, pois abusou da confiança do cidadão.
Lins tornou ladrão do cofre publico no minuto que aceitou dinheiro meu, seu, nosso (como diz um grande jornalista) e agiu como um corrupto. Por isso ele deveria ser preso, e esquecido numa cela. E os membros da Alerj que agiram com intenções pervertidas igualmente.
Em realidade o caso só fez provar novamente que não existe coerência em nosso sistema. E os eventos desenrolam de uma maneira que nos deixam perplexos. A comparação é forte sim, e Chicago era um cenário cheio de corrupção e violência nos anos 30. Mas foi nesse mesmo cenário que o sistema quebrou o ladrão. Aqui ao invés, parece que o Ladrão infiltrou o sistema. E por isso me pergunto, com quem é a maior sacanagem da comparação: Nós ou Chicago?
Assinar:
Postagens (Atom)